sábado, 15 de janeiro de 2011

A história de mais um José

José se levantou cedo, estava alegre, pois era o dia de sua audiência trabalhista, na qual ele receberia mais de dois meses trabalhados para um executivo importante. Abriu a janela do seu quarto e percebeu que o dia estava lindo. Pássaros cantavam, grilos cricrilavam e os primeiros raios do dia empurravam com suavidade a noite teimosa. Na cozinha, sua esposa - companheira de alguns anos de luta e sofrimento - aquecia o café que tinha sobrado de ontem, pois a dispensa estava vazia. No entanto, o sorriso no rosto dela fez José criar forças para mais aquele dia de luta e sacrifícios. Seu estomago roncou, talvez pela falta de comida, pois já fazia alguns dias que ele e sua esposa não se alimentavam direito. Isso porque eles optaram em alimentar os três filhos menores que estavam em fase de crescimento, e como estudavam, necessitavam mais do que eles da pouca comida que ainda lhes restavam. José estava preocupado, pois naquele dia, ele tinha que pagar uma conta importante, a fim de realizar um exame no seu filho caçula. Seu filho tinha freqüentes crises compulsivas, e necessitava urgentemente de um exame de ressonância magnética. A Municipalidade até se comprometeu em realizar o exame em seu filho, porém o advertiu que poderia demorar até um ano. Como era a vida de seu filho que estava em jogo, José resolveu pegar o dinheiro da rescisão contratual que iria receber naquele dia, e pagar pelo exame. Depois do café da manhã, José vestiu sua roupa mais nova (uma camiseta desbotada e uma calça jeans surrada) e ficou surpreso ao ver que seu último sapato não estava mais lá. Colocou sua mente para funcionar e lembrou-se da ultima enchente que invadiu sua casa, e carregou seus sapatos. Como José não podia perder a audiência trabalhista ora marcada, uma vez que seu advogado o informara que se caso ele não comparecesse, perderia a ação, pegou emprestado o par de chinelos de sua esposa e seguiu radiante até a Justiça Trabalhista. Sentado no banco das partes, José por um momento teve a impressão de estar no banco dos réus, entretanto tal sentimento fora substituído por uma alegria inexplicável, pois sabia que aquele dinheiro da rescisão contratual de trabalho, serviria para pagar o exame de seu filho, e sobraria ainda para fazer a compra da semana. Iniciado a audiência de instrução e julgamento, lá estava seu antigo patrão, o reclamado, homem elegante, com seu relógio de ouro, e exibia um lindo terno de risca de giz. Advogados das partes e o Reclamante José também estavam presentes. Todos devidamente apregoados, o Magistrado, antes de iniciar a audiência, admoestou José para que viesse adequadamente vestido para a audiência, eis que ele estava em um prédio público e que tal vestimenta não era condizente com aquele lugar (O magistrado se referia ao par de chinelos de dedos que José calçava). José surpreso, com os olhos rasos d’água, pediu desculpas para o Juiz e informou que o único par de sapatos que possuía tinha sido carregado pelas águas na última enchente que aconteceu no seu bairro. Foi quando o Juiz falou que a audiência não poderia ser realizada ante a falta de respeito de José perante a Justiça. Onde se viu comparecer em uma audiência com aqueles trajes? Assim, José voltou para casa triste e cabisbaixo, tentando levantar a cabeça, pois a vida continuava e ele era uma pessoa honesta e íntegra. Não sabia, porém, como iria falar para sua esposa sobre o acontecido. Olhou para o céu e pediu forças para continuar vivendo...

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